segunda-feira, 31 de maio de 2010

MAIS LIVROS... MAIS QUALIDADE DE PENSAMENTO...


Às vezes os gestos mais simples, mais prosaicos, escondem as mais elevadas manifestações do espírito. É o que acontece quando alguém tira um livro da estante, limpa-lhe a poeira e se senta confortavelmente em algum canto da casa. O ato em si é prosaico, mas as motivações são poéticas. Há todo um simbolismo por trás dessa ação. Sentar-se para ler um livro é confessar a disposição de alargar as fronteiras interiores, de mergulhar no mundo dos pensamentos. É vestir a armadura e empunhar as armas e o escudo para lutar contra os inimigos essenciais do progresso da personalidade: a preguiça de pensar e a negação da imaginação como força construtiva. É ainda reivindicar o direito de não ser manipulado pelas mentes medíocres que insistem em seu projeto de “emburrecimento das massas” através da “favelização da cultura”.

O clamor dos inimigos do progresso humano é por mais “pão e circo” para o povo (assim ocupado, ele pode ser mais explorado). O clamor dos heróis da dignidade humana é por mais livros. Assim, dizia Castro Alves:

Filhos do séc'lo das luzes!
Filhos da grande nação!
Quando ante Deus vos mostrardes,
Tereis um livro na mão:
O livro – esse audaz guerreiro
Que conquista o mundo inteiro
Sem nunca ter Waterloo...
Eólo de pensamentos,
Que abrira a gruta dos ventos
Donde a igualdade voou!...

Por isso na impaciência
Desta sede de saber,
Como as aves do deserto
As almas buscam beber...
Oh! Bendito o que semeia
Livros...livros à mão cheia...
E manda o povo pensar!
O livro caindo n'alma
É germe – que faz a palma,
É chuva – que faz o mar.

Ler é, também, celebrar a comunhão de mentes, isto é, a comunicação em uma de suas mais elevadas manifestações: comunicação que se baseia no diálogo das idéias entre leitor e escritor. Somos seres criados para a comunicação, para vivermos num fluxo constante de transferência de idéias e de ideais. Deste modo, estamos constantemente influenciando e sendo influenciados, sensibilizando e sendo sensibilizados. Não se trata de um processo meramente mecânico, desprovido de “alma”. Pelo contrário, a comunicação é um processo vivo e transformador: é intelecto e é sentimento, é percepção e é pensamento. Não existe absolutamente ninguém que, vivendo no ambiente da normalidade, esteja acima deste processo.

Mas, o que são as idéias? E o que são os ideais? O que é a comunicação? Idéias são construções da alma; reproduções interiores, por meio de associações, do mundo exterior que toca o nosso intelecto através dos sentidos. Ideais são idéias ordenadas de uma forma tal que coloque em relevo certos objetivos a serem atingidos. Esses dois níveis fazem parte da dinâmica do pensamento, e pensamento é consciência e autoconsciência: consciência da realidade que nos cerca, e autoconsciência da realidade que somos. A propósito, a autoconsciência é uma das coisas que nos diferenciam dos animais, pois ao contrário destes, conseguimos discernir nossa interioridade. Cogito ergo sum, “penso, logo existo”, dizia Renè Descartes. Quanto à comunicação, trata-se do tráfego de idéias e de ideais entre seres humanos. Claro que aqui estamos considerando apenas a comunicação consciente, isto é, aquele processo que visa unir as mentes em torno das idéias, fazendo uso dos sentidos e do intelecto.

Acontece que as idéias e os ideais têm o poder de colocar em ação o potencial das pessoas, e esse potencial, posto em atividade, promove a transformação da realidade. Como muitas vezes o potencial humano está subjugado aos desencantos, às angústias e ao comodismo, se faz necessário que algo externo, isto é, fora do indivíduo, intervenha no sentido de evocá-lo e desafiá-lo. Uma mente que se tornou apagada em sua capacidade de transformar-se e de promover transformação precisa do brilho de outra mente para colocá-la, de novo, em perspectiva; precisa de novas idéias que gerem novos ideais. A leitura possibilita isto.

Daí o clamor final deste pequeno artigo: Mais livros... Mais leitura... Mais autonomia de pensamento... Mais qualidade de pensamento...

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