Existir é ser: oposto do nada. O nada, por definição, é ausência absoluta, é o não-ser. Assim, o que não é o nada é existência, independente do nível, independente da forma. O ser integra a realidade, e não “é” fora dela. Então, característica do ser: ser percebido, por si ou por outros.
A percepção do ser por si mesmo ou por outros denota sua existência objetiva. Logo, o não-ser não pode, por definição, ser percebido, e se algo é percebido não é um não-ser, logo existe. Isto não significa que todas as sensações interiores, tidas como percepções, apontam para a realidade. Há de se admitir a conclusão de Descartes de que a percepção dos objetos sensíveis não está livre de enganos, o que significa que o conhecimento empírico (da experiência) em si não nos dá total garantia acerca da realidade. No entanto, isto não inviabiliza a proposição de que a existência do ser é atestada por sua autopercepção ou pela percepção de outros, pois ainda que o julgamento dos dados relativos a um objeto do conhecimento (um ser), dados estes fornecidos pelos sentidos à razão, possa estar equivocado, não se pode duvidar da existência de tal objeto, pois a mesma não está atrelada ao tipo de julgamento que dela se faz. Desta forma, ainda que se julgue mal um ser percebido, não se pode duvidar de que a simples percepção do mesmo confirma a sua existência.
Isso é verdade para todas as categorias de existência. A Bíblia nos fala de duas principais: existência necessária e existência derivada. A existência necessária é a existência “em si e por si”, e pertence exclusivamente ao Ser necessário (Deus). A existência derivada é a existência recebida e não é em “si mesma”, pois depende de outro ser que a origine. É, portanto, a categoria de existência de todos os outros seres que não o Ser necessário. A existência necessária não tem um marco inicial, pois uma vez que não é derivada de outro, e nem pode ter-se originado do nada (pois do nada, nada vem), só pode ser eterna. Por sua vez, a existência derivada ou recebida tem um início, portanto não é eterna, sendo, por isso, limitada.
A Bíblia apresenta Deus como um Ser cuja existência está em Si mesmo, sendo que esta abarca a totalidade do tempo histórico (passado, presente e futuro) e o ultrapassa, pois nessa relação Ser & tempo, o Ser é anterior ao tempo. Isto fica evidente pela resposta de Deus a Moisés, quando este lhe perguntou acerca do Seu nome: “Eu Sou o que Sou” (Êxodo 3:14). Tal afirmação evoca a idéia de independência absoluta e de total autosuficiência, inclusive com relação ao tempo.
Sendo Deus, portanto, um Ser, Sua existência, necessariamente, deve ser percebida. O testemunho bíblico acerca disto nos dá conta de que Deus não apenas tem plena consciência de Si mesmo - autopercepção (cf. o versículo acima mencionado), mas também se torna evidente na mente de suas criaturas. É o que diz Romanos 1:19-21: ”Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis; Porquanto, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu”.
O fato de que a existência de Deus é percebida por suas criaturas é atestado pela universalidade da idéia da divindade. Apesar de não haver uma unanimidade na definição desta, sabe-se, de forma geral, da existência do Ser Superior, muito embora tal idéia seja, às vezes, diluída na concepção de múltiplas divindades (como no politeísmo), ou na universalização do conceito de Deus (como no panteísmo), mas aqui deve-se considerar o que foi dito acima, ou seja, que apesar da possibilidade de se julgar mal um ser percebido, não se pode duvidar de que a simples percepção do mesmo confirma a sua existência. Assim, não é a forma como se entende este ser, mas a conclusão de que o percebê-lo atesta a sua existência.
Portanto, se tem-se consciência da idéia de Deus, e se esta é corroborada pelos fatos externos, que fazem eco na interioridade, então Deus existe, pois o não existente, o não-ser, o nada não poderia desencadear tal processo, por uma impossibilidade lógica.